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“Vagner para mim é tudo”

Entre quatro paredes brancas de um quarto de hospital, reluz o amor incondicional de uma mãe que se dedica integralmente ao filho, deixando de lado sonhos e projetos para o futuro. Toda essa renúncia, contudo, veio em nome de um sentimento que falou mais alto dentro do coração materno de Silvania Oliveira Alves, 53 anos, após o filho dela, Carlos Vagner Alves da Silva, 27 anos, ter sido diagnosticado com uma Insuficiência Respiratória Crônica em decorrência de uma Meningite que teve quando criança. A doença deixou sequelas irreversíveis que há dez anos mudaram por completo a rotina da família. Vagner se tornou inteiramente dependente da ventilação mecânica para sobreviver e, em função disso, mãe e filho passaram a residir no hospital.

COM A PALAVRA - Como foi a descoberta da doença do seu filho?

SILVANIA OLIVEIRA - Vaguinho nasceu de um parto normal. Com 1 ano e 15 dias ele teve meningite, da meningite ficou a sequela. Até os 18 anos ele morava em casa, era normal, tinha umas certas crises de cansaço e se aliviava com a nebulização, mas foi chegando o tempo de a nebulização de casa não surtir mais efeito. Chegou uma certa tarde que ele teve um cansaço muito forte, foi para o hospital e teve que ficar internado na UTI por três meses. Hoje faz mais ou menos dez anos que Vaguinho tá internado. A gente fez desse quarto a nossa casa, sabe?! Não é muito bom você morar em um hospital. Todas as datas comemorativas a gente tenta ornamentar, deixar o quarto bem parecido com a casa da gente pra dar um certo conforto a essa forma de vida, que não foi a forma que a gente esperou.

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C.P - Como foram esses últimos dez anos acompanhando ele?

SILVANIA - Parece até coisa de louco o que eu vou dizer. Quando Vaguinho ficou na UTI durante os três meses, o médico me chamou e disse: “Olhe, eu tenho uma notícia muito desagradável para lhe dar a respeito da saúde de Vagner. A gente fez várias tentativas de desmame do aparelho, mas ele não tem capacidade mais de ficar fora do ventilador”. Por Vaguinho ter os cansaços que tinha, as crises de asma fortes e quando tá no ventilador, como tá agora, respirar tranquilamente... ah... fiquei aliviada.

 

Assim ele estava bem.

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Por conta de uma doença, Vaguinho ficou nessa situação, com essa sequela. Não anda, não fala, não tem controle de cabeça, não tem controle de tronco, não tem coordenação motora, depende 100% do ventilador e depende 100% das pessoas, no caso eu, fisioterapeuta, médico, enfermeiro, família e tudo mais. E tá Vaguinho aqui, tendo os tratamentos que em casa não conseguiria ter. Se disser assim: a gente vai montar uma Home Care* pra você ir pra casa ou você prefere ficar aqui no hospital?” Eu não hesitaria em dizer que eu prefiro ficar aqui no hospital, é mais segurança. E eu como mãe tenho que me dedicar. Esses dez anos pra mim foram como se Vaguinho tivesse nascido novamente e a vida dele começou a contar a partir da data que ele foi pra ventilação mecânica.

Entrevista produzida por:

Alidiane Carlos

Aline Calisto

Eloyna Alves

Íngrid Montenegro

Simone Silva

 

Novembro de 2016

Foto: Aline Calisto

O lugar incomum para se morar não é, portanto, sinônimo de falta de afetividade e conforto típicos de um lar, apesar de todas as limitações, obviamente. Eles são naturais de Campina Grande e atualmente estão no Hospital Universitário Alcides Carneiro (HUAC), no bairro do São José, localizado na cidade natal deles. Com o olhar protetor de mãe, Silvania acalenta o filho, que retribui com um sorriso largo todo o carinho recebido. Essas cenas se repetem dia após dia, mostrando que ambos aprenderam a conviver com essa realidade e também que se entendem dentro desse universo particular. Dividindo sofrimentos e alegrias, derrotas e vitórias, angústias e conquistas, mãe e filho construíram uma nova concepção de mundo e se ajudam diariamente na batalha pela sobrevivência, buscando forças em Deus, na família e em um amor que tudo suporta. 

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A história desses personagens você confere nessa entrevista em que Silvana conta um pouco das transformações que aconteceram na vida dela após a doença de Vagner, a quem ela chama carinhosamente de Vaguinho, ou simplesmente Anjo de Luz.  

C.P - E como é a sua rotina?

SILVANIA - Minha rotina aqui é pensando na hora de ir pra casa, porque a gente fica muito tempo aqui dentro, aí eu já fico: ai meu Deus do céu... quando eu for pra casa vou fazer isso, vou fazer aquilo e quando chego em casa não faço nada daquilo como que eu planejei fazer. É pouco tempo. Às vezes vou para o sítio com meu pai e quando chego é a hora de ir almoçar. Eu almoço, durmo um cochilozinho, vou engomar umas roupinhas dele pra trazer e quando penso que não, já é hora de voltar. Tem vezes que passo dez dias aqui seguidos sem ir em casa.

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C.P - No quarto em que vocês estão há algumas imagens religiosas e a Bíblia aberta também. Dá para perceber com isso que você é uma mulher de fé. A crença em Deus, de alguma forma, lhe conforta e fortalece?

SILVANIA -  Com certeza. Deus é a base. Ele é a fortaleza, Ele é o alicerce de tudo! Se não fosse Ele a gente não seria capaz de nada nessa vida. A gente busca Deus todas as horas e é a única forma, é o remédio para alma, é o remédio para o espírito. É a nossa forma de viver. A gente vive em Cristo, porque se não fosse Ele a gente não conseguiria viver tão bem.

Entenda a trajetória de Vagner, ou simplesmente, Vaguinho:

Há 18 anos Silvania Oliveira foi vítima de um aneurisma e ficou entre a vida e a morte. A doença fez com que ela tivesse uma nova perspectiva de vida e foi a partir desse momento que Silvania pediu forças para continuar vivendo e cuidando do seu filho especial, ou do Anjo de Luz que Deus enviou para ela, como prefere chamar. Desde então, Vagner tem sido para ela a maior razão de viver. Todos os dias, cada um a seu modo, faz orações para agradecer o dom da vida e pedir dias melhores.

SAIBA MAIS

C.P - Fica muito marcado na sua fala que não é nenhum fardo a dedicação integral ao seu filho. O amor incondicional de mãe e a fé em Deus lhe ajudam a seguir em frente nessa batalha. Mas o que foi preciso deixar para trás e abdicar por conta dessa nova condição de vida?

SILVANIA - Foi uma vida que eu tinha de pessoa normal, mesmo tendo Vaguinho com limitações em casa. Deixar uma vida social, um outro filho, uma neta, deixar praticamente uma família para viver, hoje, dentro do hospital. Eu abdiquei de passeio, de festa, de tudo isso para viver diretamente com ele. Eu era dona de casa, faz 23 anos que eu sou divorciada. Quando eu me divorciei, eu passei a morar na casa dos meus pais. Vaguinho era pequeno, foi criado por mim e por meus pais. Minha vida era uma vida comum em casa. Agora eu tenho o apoio do meu pai, mãe, meu outro filho (que às vezes fica com ciúmes) e três irmãs minhas. Não vou dizer que sou completamente satisfeita com a vida que tenho. Não sou porque Vaguinho vive diuturnamente dentro desse quarto. Eu queria que ele tivesse uma vida melhor, de sair no feriado, dia de domingo, ver o mundo que nós vivemos e a luz do sol. Para que eu tenha paz preciso ver Vaguinho sem ser prisioneiro do próprio corpo.

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C.P - Diante de tudo isso, você se sente confortável morando no hospital?

SILVANIA - Indo para casa não vou ter a liberdade que eu tenho quanto tô aqui, de poder sair de vez em quando um momentinho. Ele vai exigir muito mais de mim e não vai ter a assistência médica que tem aqui quando ele apresentar algum problema. Eu me dedico 99% a ele 1% a mim. Se ele for para casa não vou ter nem esse 1%. Aqui eu me sinto mais segura, aqui me sinto em casa. Aqui é minha casa! Até quando eu não sei. Mas sei que Deus vai obrar um milagre na vida dele, porque milagres existem e eu estou na fila aguardando o meu milagre vir e acontecer. Talvez não seja o milagre da cura da matéria, seja da cura do espírito. Eu estou na fila aguardando um desses milagres. Quando ele chegar, é porque foi determinado por Deus.

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* O termo Home Care é de origem inglesa. A palavra “Home” significa “lar”, e a palavra “Care” traduz-se por “cuidados”. Portanto, a expressão Home Care designa literalmente: cuidados no lar. (Fonte: Portal Home Care)

Um dos sonhos de Silvania é fazer com que o filho possa sentir o vento no rosto e sair por alguns instantes do quarto do hospital para ver o mundo. Por conta disso, ela está com uma campanha na internet para arrecadar dinheiro e comprar uma cadeira adaptada às necessidades dele, com respirador portátil e cilindros de oxigênio para que ele possa sair do quarto e interagir com o mundo.

 

Acesse:

https://www.vakinha.com.br/vaquinha/ajude-o-vaguinho

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