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Artesã de Itabaiana moderniza o artesanato local

 

 

Na cidade de Itabaiana, agreste paraibano, a cultura do artesanato local e tradicional ainda resiste à ação do tempo e a modernidade dos aparatos tecnológicos. No município ainda residem diversos artesãos que dependem diretamente da comercialização de seus artefatos para sobreviver.

 

O artesanato muitas vezes é visto como um trabalho de “fundo de quintal”, mas D. Nevinha surpreendeu e o faz numa escala muito próxima ao formato industrial, uma vez que outros artesãos na cidade não tem o mesmo espaço, equipamentos e mão-de-obra para desempenhar as funções de apoio e ela assim o faz. 

 

Conhecida como D. Nevinha, Maria das Neves Paiva, 65, desde criança trabalha com artes manuais e através da sua família, deu seguimento ao trabalho como artesã. Sua descendência indígena foi fator primordial para prosseguir por esta área. A cultura do índio associada às expressões artísticas do nordeste enriquecem suas obras e são características e de seu trabalho, que hoje são famosos na Inglaterra e em outros países da Europa.

COM A PALAVRA - Há 35 anos você lida com esta profissão em algum momento já pensou em desistir?

DONA NEVINHA - Esta ideia nunca passou pela minha cabeça, faria tudo novamente se fosse possível. Não me arrependo de nada que fiz para chegar onde estou hoje, porque tudo foi por uma boa causa, pelos filhos, pela família e pela arte.  Tudo isso me proporcionou o que tenho hoje na vida, esta essência é Linda.

 

C. P - Depois de vários anos, tecendo esta idéia da arte manual, quais são expectativas para seu futuro?

NEVINHA - As minhas expectativas para o futuro é viver melhor, gosto muito do meu trabalho e de tudo que ele trouxe para mim. Em toda minha vida quando iniciei os trabalhos com artesanatos que eu nunca pensei em desistir dessa ideia. Sou muito proativa faço a parte empresarial do meu trabalho, resolvo problemas e fecho negócios.

 

C. P - Com esta profissão deu para conquistar tudo o que você desejou para sua vida?

NEVINHA - Tudo realmente que eu desejei eu consegui sim com o esforço do meu trabalho, mas tudo começou de uma forma ainda mais simples. Não foi nesta casa foi em outra e ela tinha apenas uma sala com os equipamentos para trabalhar e foi assim, na época eu fiz um empréstimo no banco do Brasil, no momento que a data vencia, às vezes não tinha o dinheiro, pedia mais uma vez dinheiro emprestado para quitar até ter o meu capital de giro para investir. Uma vez estive em Santa Rita e vi uma casa de primeiro andar e terraço e sonhei hoje como você pode perceber a minha casa é assim do jeito que desejei, do mesmo jeito foi quando pensei em possuir uma moto, hoje resolvo tudo.

 

C. P - Você acredita que pode haver a extinção deste tipo de trabalho?

NEVINHA - Eu acredito que possa diminuir o número de pessoas que produzam esta arte, mas acabar, não creio que isso venha acontecer. Sempre existirá alguém que produza e que faça algo sobre barro, ou qualquer tipo de arte.

 

C. P - Você tem vontade de repassar o ofício para outros membros de sua família?

NEVINHA - Eu sempre tive interesse em repassar a profissão, mas nunca percebi interesse nos meus filhos para continuar, inclusive nos cursos que fui convidada para ministrar o interesse era o mínimo, mas eu segui em frente e meu marido junto comigo.

 

C. P - Você já exportou seu trabalho alguma vez para outro estado ou outro país?

NEVINHA - Bom, já exportei sim, principalmente para a Inglaterra, o primeiro pedido exigiu 150 peças, o segundo 400 peças e foi aumentando até chegar a 7 mil, mas tenho receio pelos outros clientes do Brasil e Paraíba, porque ficamos presos a estes pedidos, está tomando nosso tempo e não estou produzindo para eles. Vou ter que barganhar para Inglaterra, para tentar diminuir o número de peças produzidas para eles e assim conseguir produzir peças para meu estado.

 

C. P - Quais os eventos que a senhora participa?

NEVINHA - Além do São João que é o evento que nossas peças ficam mais em evidência, também temos algumas exposições pequenas, porém nem sempre tenho este tempo, pois trabalho durante muito tempo e tenho que dar de conta de todo este material no prazo exato.

 

C. P - Como a senhora analisa hoje a conjectura do artesanato contemporâneo? Mudou algo nesses 35 anos de trabalho?

NEVINHA - O artesanato não mudou em nada ele continua caracterizando a cultura nordestina em todo o seu contexto. Mas o número de pessoas que o produzem me deixa apreensiva, pois vem diminuindo, mas ele nunca será esquecido mesmo que uma única pessoa fazendo-o nesses duzentos e vinte e três municípios já é o suficiente para essa arte não desaparecer. A começar por mim aqui em Itabaiana.

 

C. P - Como é a visão da artista popular Nevinha sobre essa arte?

NEVINHA - Vou falar como intérprete da arte e não como artesã que me tornei. O artesanato era pra ser considerado pelos críticos de arte a “primeira arte”.  No segmento histórico deveria ter uma difusão mais ampla inclusive nos livros de literatura que os alunos estudam no ensino médio, igualmente as outras artes como os estilos de vanguarda, por exemplo, o cubismo que é moldado em formas geométricas e que retratam idéias ultrapassadas das pessoas sobre algum assunto. Que do mesmo jeito o meu e o nosso artesanato também retrata algo parecido.

C. P - Qual é a sensação de atingir todos os objetivos de família, trabalho, recursos para investir no ofício e ter dinheiro livre para outras coisas através do artesanato?

NEVINHA - A melhor sensação é a que você está pensando agora, nesse momento que me fez essa pergunta e lhe confirmo: eu sou realizada tudo que almejei na vida consegui e tenho outros planos para colocar em prática, projetos que estão em minha mente e que estou articulando, mas não falei ainda.

 

C. P - Como a senhora caracteriza o plano de governo que o estado tem para os artesãos?

NEVINHA - Essa sua pergunta é interessante veio em um bom momento da nossa conversa. Como você sabe participei do salão do artesanato de Campina Grande que foi mal planejado pela secretaria de estado da cultura, faltando poucos dias para o início do evento todos os artesãos participantes, ou seja, nós, não tínhamos um lugar para expor nossas obras. Aquele espaço que sediou durante o período de exposições fora conseguido por motivação de nós profissionais. O governo não apóia os artesãos, tivemos dificuldades até para conseguir um bom alojamento para passar a noite. Essa gestão não agrada a nossa classe.

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C. P - Eu já havia feito essa pergunta de outro jeito, mas vou perguntar novamente, como funciona o mercado financeiro nessa área? Dá realmente muito dinheiro?

NEVINHA - Bem não posso falar o meu segredo a você, mas em toda a profissão tem momentos de faturar muito e têm outros que fatura menos há algumas oscilações como existem em outras profissões e isso é normal. É tudo que posso falar. (risos)

 

C. P - Então artesanato é uma atividade que apenas pode dar dinheiro?

NEVINHA - Toda profissão bem planejada e articulada pode ser rentável para qualquer pessoa que se proponha a logística de seu trabalho cabe a o indivíduo perceber as nuances dele o seu período de melhor aproveitamento e fazer dele algo que perdure por boa parte do ano. Porque tudo ano a ano que passa em nossa vida tem o apogeu. Então vou imaginar isso durante um tempo. E vou fazendo as minhas escalas para aproveitar isso.mas busco informações de pessoas especializadas que nessa linguagem empresarial é chamado de micro-empreendedor  e eu me considero encaixada nesse estereótipo.

 

C. P - Como é a sua relação como outros artesãos aqui em Itabaiana?

NEVINHA - É a melhor possível, tenho uma relação amigável com eles somos profissionais da mesma arte, não podemos ter intrigas isso pode prejudicar negócios apesar ter mais capital de giro pra investir no negócio e ter uma visão mais empresarial desse empreendimento e que conversando com eles, não percebo isso na nossa interação o que me torna diferente no segmento e não melhor que eles.

 

C. P - Como a senhora vislumbra o artesanato hoje?

NEVINHA - Como uma condição para ser caracterizada no cenário nacional como uma cidadã nordestina e indígena que sou. Ele é a maneira mais subliminar de caracterizar um povo que tem obrigação de sentir orgulho de suas raízes, de suas manifestações locais e defendê-los para o resto do país uma vez que a região sudeste do Brasil de certa forma torce o nariz para o nordeste mais exatamente a Paraíba.

 

C. P - Como a senhora se vê hoje enquanto artesã?

NEVINHA - Eu me vejo como uma desbravadora na cidade que eu moro com as condições econômicas que ela tem e eu me condicionar numa artesã com formato de empresária. Colocando a mão no barro apenas quando é necessário isso nos dias de hoje. Sabemos bem que Itabaiana é uma cidade pólo de outros municípios mais isso apenas é uma nomenclatura que serve só para enaltecer a cidade do ponto de vista geográfico.

 

C. P - qual foi o seu momento de dificuldade na profissão?

NEVINHA - Foi o momento que faltou a matéria-prima para produzir as peças. Uma situação desagradável que não desejo a profissional nenhum e eu tinha umas peças que já estavam com o prazo de entrega em atraso por conta disso, e era um cliente que tinha um outro pedido de encomendas e quase o perdi. Espero não passar mais por isso.

 

C. P - como será as próximas produções artesanais? Tem algum tipo de peça que a senhora pensou e decidiu torná-la exclusiva?

NEVINHA - Será de acordo com os pedidos que estou atendendo e que ainda vou receber e essa coisa de peça exclusiva, no artesanato isso não ocorre com muita freqüência comigo falo isso pelas experiências que vivi mas posso fazer isso caso ocorra. Sou uma artesã uma espécie de profissional das artes.

 

 

Processo de modelação do artesanato

Artesanatos produzidos pela D. Nevinha 

D. Nevinha e os artesãos em processo de criação dos artesanatos

Entrevista produzida por:

Leonardo Santos

Jefferson Barbosa

Foto: Leonardo Santos

Foto: Leonardo Santos

Foto: Leonardo Santos

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